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sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

RETRATO PRESUNÇOSO





Vivo de convicções, certas e erradas. Talvez por isso meu metro de vida até agora, mais do que ser apenas uma linha de tempo, reta e despercebida de si mesma, tenha sido de sobressaltos, margeada por céus e purgatórios. São as minhas escolhas. Por mim, nada pode ser morno; nada foi e não será sem sal e pimenta. E minhas doçuras, ah, essas repugnam as abelhas. Tenho a presunção, uma de tantas, de não ter vindo mais ou menos viver.

Sou um ser atormentado pela lógica, buscada com intransigência, ainda que em causas absurdamente mínimas. São as minhas miudezas. E tenho como antepenúltima presunção ser, das três coisas que meu pai precisava para seu complemento, o livro que ele plantou.

Vivo de ventos fortes, sol escaldante e tempestades, permeadas por recuos de marés. Sei que o saldo disto tudo são marcas, melhor, voçorocas em corpo e alma. Nunca me vejo um pátio bucólico com folhas caídas, pequenos galhos frágeis e velhos esparramados; ou pouco chamuscado. Por vezes racha-me o tronco, remexem minhas raízes e me incendeio. Por outro lado, não consigo me imaginar num fim medianamente feliz.  Prezo o “ser” por permanente, embora não seja; provoco o “estar”, qualquer que seja, de prazer ou dor, para que não seja apenas o vão momento.  E descubro certo sadomasoquismo em viver com intensidade.

Digo aos meus afetos como sou. Alguns acreditam, outras não dão bola, e ainda outros vivem de se sobressaltarem. Contrariam-se, depois sem saber o que fazer comigo acabam esquecendo, que é seu modo de perdoar e me aceitarem. E há outros que, passado o momento de contrariedades, ao serem perguntados por mim, acredito que gostariam de responder “quem?”. Isto, no entanto, esbarra na minha penúltima presunção: Passar pela vida das pessoas de tal forma que impeça este tipo de pergunta. E como venho de aquerenciar afetos, e como já é tarde demais para trocar de roupa, sigo fiel e desconstrangido com a indumentária cedida pelos anjos tortos que me anunciaram.

Por precaução sempre revejo os picos anímicos, suas antevésperas e seus rescaldos. São os meus coquetéis; os espumantes e chazinhos pósteros espirituais, mas são também minhas jurisprudentes terapias. O sem graça disto é que hoje pouco me surpreendo.

Por fim, quando a luz ficar esmaecida, bem no finzinho da tarde, por certo vou estender a rede em estágios temporais de riso e paz, e isto, mais do que ser meu desafio, é minha última presunção.

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