Você vai perceber quanto do metro do tempo já se foi olhando suas fotos; as fotos dos seus filhos e dos filhos deles; e talvez ou daqui a pouco, as dos filhos dos filhos deles. Você pensa que já passou, que morreu para o mundo que passa do outro lado da rua, mas não, apenas envelheceu.
E tudo passou num zás! Parece que foi ontem que você dava piques escada abaixo, com pouco efeito solo, calçando um tênis, com uma bola embaixo do braço e com um fôlego inesgotável. E depois, mais e mais atividades, até que aquele fôlego prepotente arregasse, e lhe mostrasse a fragilidade de estar de posse da carcaça emprestada em comodato pelo Criador. Ah, saudades daquelas juntas, daqueles joelhos sadios de cartilagens risonhas, daqueles ombros irresponsáveis e da musculatura que, acontecesse o que acontecesse, parecia que não tinha acontecido nada. Você usava e abusava da sua musculatura rija. De todas elas.
Se ainda tem dúvidas de que o tempo voa, basta lembrar se ontem mesmo você tomava algum analgésico ou anti-inflamatório ao menor sinal de desconforto. Quantas vezes por ano sentia necessidade de ir ao médico, enfrentar uma bateria de exames, alguns constrangedoramente invasivos? Você não vai lembrar. Hoje, as recomendações dos operadores de saúde começam com a obrigação de você fazer ao menos 10% do que fazia anteontem, apenas para se manter minimamente saudável. O que não exclui a investigação rotineira de procurar algo que certamente será achado. Afinal, para que servem as manutenções médicas, não é mesmo?
O tempo não para. Nem preciso ser Cazuza para dizer isso, e nem oferecer a essa sentença um ar reflexivo. Nós já desistimos de olhar a vida passar, muito porque ela não deixa. Ela passa e pronto, e você que trate de se inserir entre datas comemorativas, preferencialmente lúcido. Mesmo que incomodado por essa sensação de ser folha seca soprada no redemoinho do tempo, atordoado e de pouco chão. Aonde o vento pretende nos levar? Sabemos, claro, nascemos com prazo de validade. Só não sabemos quando, mas mesmo sabendo que falta menos do que faltava há pouco, estamos sempre desconfiados, e torcendo, que vá demorar. Portanto, pisque e já será daqui a pouco; durma e você acordará um ano mais velho. E quando a luz definitiva se apagar, que seja como em uma noite de porre. Apenas um sono pesado e sem sonho para não haver esperanças de acordar. A gente sabe que a esperança é mais pé no chão do que a fé.
O que ganhamos ao nascer é o presente, e a vida sempre será isso: o presente. Então que possamos fazer dele o melhor presente e aproveitá-lo como verbo e substantivo. Mas passa, como os parágrafos anteriores também passaram.
O poeta cubano José Martí sentenciou: “Plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro: três coisas que toda pessoa deve fazer durante a vida”. Agora você sabe porque. São as formas físicas que você tem de se eternizar, seja na natureza, seja no coração dos seus, ou em alguma estante.
Ao fim, é o que importa. Gracias a la vida y a mis hermanos, tantos, que no los puedo contar

Nenhum comentário:
Postar um comentário