Eu devo ter concluído meu processo de nascimento depois
de adulto. Não faz muito. E logo que terminei de nascer fiz o pacto de vida que
consagra as relações de amor. Prometi me
amar e respeitar na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, na riqueza e
na pobreza, até que a morte me divida nas duas partes conhecidas, e me dê o
destino final: uma ao pó, de onde dizem que eu vim, e outra ao éter, para onde
dizem que eu vou. Não, nunca fui dependente químico, é apenas um formato de olhar
as Escrituras.
Então, amado e respeitado por mim mesmo entendi que não
haveria de ter problemas de auto-estima. Mas sabe, nesta pista de combate em
que nos inseriram sem pedirem nossa opinião não há moleza. As vezes vacilamos e as vezes duvidamos
daquilo que nos ensinaram a acreditar, até chegarmos a pergunta fatal,
estimulada pelo Thomé nosso de cada dia, que está sempre ali, arretando nossos vacilos
nos momentos de suspicácia: “mas se o Homem deixou que fizessem aquela barbaridade com o ungido, o que não deixará que façam comigo?”.
Bueno, bueno. Já duvidei no mínimo três vezes e o galo nem precisou se
manifestar. Continuo cabo eleitoral do Mano, embora fé seja um dom, e eu não fui agraciado com ela. (do livro Anjos e demônios).
Gente como eu não nasce para ser personagem de folhetins apócrifos.
Vivemos de contos complexos; amontoados de loucas histórias. Ou pequenos contos
em série, por vezes absurdos e como meros coadjuvantes, mas sempre reais. Os
meus, por vezes, são espasmos biográficos que vivo ao acaso, e que pouco pretensiosamente
registro com o intuito de dizer a mim mesmo, e continuamente, que não ando pelo
vale de sentimentos controversos em vão. Esta gente como eu me defino, é partidária
de que o pior do baile não é não ter dançado, mas não ter sido percebido.
Enfim, gosto de estar vivo seja para clicar no “curtir” a
todo o momento este milagre, ou para viver e compartilhar as catástrofes da
espreita; seja para amar em completa entrega, ou para lembrar-me de ter passado
por cima de amargos desamores. Não importa. E Não tenho medo de morrer, tenho uma
espécie de remorso prévio do dia em que isso acontecer. Neste caso, que se tenha cumprido naturalmente a volta dos ponteiros do
relógio, preferencialmente com atraso, bem lá adiante, quando as pernas
buscarem apoio sem encontrar, e a cabeça tenha perdido todas as suas saudades. Não
as perceba nem entre tangos e malbecs.