No semáforo, quando o amarelo acende, você deve aguçar sua atenção. Há os outros, você não está sozinho na via... Perceba os sinais, você não está sozinho na vida.
Construí
minha vida cercado de afetos, mesmo que brincando de equilibrista em cordas de espinho. E flutuei
em versos que me sentenciavam ”nenhum pesar me derruba, qualquer paixão me
arrebata” (Luiz Coronel).
Houve o tempo do “bota fora” afetivo, quando se judiava de corpo e alma em nome da
grande busca. Da busca, sim, ou não passamos metro e meio de tempo buscando
pouso em olhares transeuntes; ninhos de braços; vozes sussurradas de dormir;
vozes roucas de acordar, e ouvidos sintonizados numa frequência perto da nossa. Mas o
foco foi e sempre será viver arrebatado pelas mesmas paixões. E a esperança de
que jamais venham delas os pesares.
Mas a mim acostumaram a identificar, ou a vida me ensinou, que a primeira lição de afeto que devemos aprender é o auto amor. Ou o Criador não teria mandado, e alguém prontamente obedecido, escrever que devemos amar o próximo como a nós mesmos. Assim, o máximo de amor que podemos oferecer a alguém é um do tamanho do próprio. Se não há por si, não há o que dar.
Essa tese invalidaria qualquer auto atentado, seja ele pragmático e drástico, seja por processo
depressivo para dar fluxo lento à definitiva consequência. Nunca elaborei bem as mortes vãs, e até já me indispus com o "Velho' por causa de algumas, Nunca aceitei mortes de amor, mesmo que este seja ultrajado; que tenha enuviado os olhos e trazido bile à boca, com notas acre de sangue. Recusar-se a isso é a forma que temos de duelar com as nossas meio-mortes ao longo da vida.
Há
entre eles os que viveram ensimesmados, tornando-se ícones do vazio, com quem
nos distribuímos entre carinho e pena extremados. Onde guardavam seus dias,
normalmente cheios de sentimentos fortes e amargos, nunca soubemos.
Recolhiam-se no baú de tempo onde viviam, definhavam e morriam de amor. Por
excesso ou falta dele, onde a reciprocidade é fundamental. Por nunca termos ousado invadi-los com nossa curiosidade
solidária (ou mórbida, que fosse), tornamo-nos cúmplices por seus encurtamentos
de vida.
Vinicius
chamou de Alfredo um vizinho do lado que “se matou de solidão. Abriu o
gás, o coitado, o último gás do bujão!”
Triste vida e triste fim de uma metáfora. Não sei porque se matam ou se deixam morrer os “alfredos”, embora carreguem um pouco de
cada um de nós. O certo é que não se permitem deixar que as etapas se cumpram naturalmente; que a morte chegue no seu tempo. Nossos "alfredos" não conseguem lutar contra a degradação dos mapas corporais, os algarismos dos planos de saúde e os ais sofridos de
organismo e alma. Os "alfredos" sofrem disso. Não absorveram o valor desse senso, e amargam suas sequelas. Não se permitem deixar que simplesmente morram encharcadas suas patologias espirituais entre tangos e malbec’s. Vivem de ser a própria letra trágica do tango. Deixam de sentir para se tornarem saudades, quase sempre cedo demais; irremediavelmente esperado, mas sempre incompreendido. Entretanto e ainda assim, nos permitimos a surpresa e o espanto.
Há pessoas que me fazem falta. Amigos que partiram para a última grande viagem, e estão por ai dando uma voltinha pelo cosmo. Não por alma penada, mas por terem deixado conosco uma presença tão forte, que nós mesmos os aprisionamos na memória, e de tal forma que é impossível não percebê-los como personagens permanentes nas paisagens cotidianas. Suas luzes (ou grilhões) são nossas saudades.
2 comentários:
Maravilhosa sua crônica, caríssimo escritor e amigo Jair Portela, a quem tive o prazer de conhecer.
“Que não deixemos de sentir, para nos tornarmos saudade, quase sempre cedo demais, e tenhamos mais curiosidade solidária.” (fala do texto: ALFREDOS de Jair Portela)
Continue nos proporcionando o prazer de sua escrita literária e, sobretudo, criativa. 🤗
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