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quinta-feira, 19 de abril de 2012

VERSOS SATÂNICOS 35


 O pedágio Divino
O que adianta ter o melhor clima e ainda por cima, 
natureza de incomparável beleza? 
Muita formosura e pouquíssimo vintém.  
Ah, mas que tem dedo do Criador, isso tem! 
Nossas orações não são bastante, 
nossos apelos ninguém ouve, 
embora não haja santo que o povo não louve. 
Fôssemos nós arrogantes zagueiros argentinos
até entenderia tão desafortunado destino. 
Mas não, pobres de nós insones de esplêndido berço, 
dedos rijos de rezar o terço, 
humildes e genuflexos vassalos, 
ninguém quer saber onde apertam os nossos calos.

O Homem não quis deixar tudo de graça, 

algum sacrifício haveríamos de fazer. 
Ora viver de sol, futebol, carnaval e cachaça! 
O preço, porém, bem que poderia ser mais humano. 
Impostos europeus com retorno haitiano, 
regime democrático instalado, 
mas cheio de político safado 
e eu que nada afano, tampouco tenho amigo bichano, 
embora não seja puritano, como a maioria fico aqui, 
permanentemente entrando pelo cano.

Diariamente vamos contabilizando dissabores 

à proporção que vemos nossos defensores 
reforçando o próprio cofre. 
Do Chui ao Oiapoque! 
Pode ser que me equivoque, 
afinal sou dessas tantas velhas almas desoladas 
que só não está com a cabeça calva 
pelos ancestrais indígenas, 
mas longe de ser um alienígena. 
Basta que eu abra os jornais 
para lavar os olhos de roubos, desfalques, corrupção. 
Todo mundo metendo a mão e ninguém mais leva medo. 
Quando se trata de enfiar o dedo 
qualquer um dá seu jeito e 
para sacramentar o desrespeito, 
aposto e não perco, 
não importa o que venham a produzir de esterco, 
todos haverão de ser reeleitos.

Pagamos caro por este belo país 

cuja política fede de inchar o nariz. 
O que seria de mim, caso fosse deputado? 
Andaria envergonhando o eleitorado 
sujeito a inquérito, ou seguiria a lição do velho Ramão: 
perca dinheiro, mas não perca o crédito. 
Lições velhas do pretérito. 
Mas sem entrar no mérito, 
não vejo partido que me acolha. 
Sinto-me, por isso, um bolha 
já que ajudei a retirar a rolha 
para que tivéssemos o direito de escolha.  
Deu no que deu, busquei a luz encontrei o breu. 
A ocasião faz o ladrão, há muito se diz. 
Creio, porém, que isso vem da raiz. 
Da matriz, dos tempos juvenis, 
lá de onde vem a força motriz e a diretriz 
que faz com que a consciência seja o principal juiz. 
Pouco importa se na origem haja o verniz 
de um berço feliz ou a cicatriz da meretriz.

Ficha limpa hoje é handicap, 

passou a artigo de luxo. 
E chegou até nós o papelucho. 
Até pouco não tínhamos nenhum gaúcho 
metido em falcatrua. 
Súbito, surgiram vários a tripudiar sobre nós outros otários. 
É claro, aqui também se evacua, 
e quando cheirou, cheirou forte 
mostrando que não é só o pessoal do norte 
que mexe onde não devia. 
Apesar da xenofobia 
que ousamos olhando acima da linha do Equador, 
reconheço que somos iguais na saúde e na doença, 
na alegria e na dor, na sujeira e no fedor 
mostrando o quanto é pesado o pedágio cobrado pelo Criador. 
Bem feito pra mim que dei um pau no Sarney 
e no Renan e acabei tendo que engolir o Detran. 
E ainda não chegamos ao fundo do poço. 
“Fora o aipo”, como diz o grosso.

O Altíssimo teria tido um lampejo 
no sexto dia
(não haveria de ser um gracejo), 
antes do primeiro bocejo: 
“Haverá muita alegria, muita beleza nesta terra. 
Clima, campos, praias, serras, 
mas haverá um contrapeso para que não haja ciúmes de outros povos...” 
E assim, de tempos em tempos 
apoiamos velhos problemas novos, 
sempre de onde deveria vir o exemplo. 
Eleições após eleições eu contemplo veteranos e calouros vendilhões do templo.

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