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quinta-feira, 22 de março de 2012

SUPLICIO DE UMA SAUDADE




                                                                                                   Para Daisi Soares

Faz frio, chove, mas é sábado e com isso todas as agruras do tempo serão perdoadas. Serão perdoadas também as indisposições e constrangimentos da semana. As decepções dormiram ontem e esqueceram-se de acordar hoje. Também não serão lembrados os fatos bons, uma vez que já cumpriram sua função social e, caso se repitam futuramente hão de ser novos, e novidades boas sempre são bem vindas quando acontecem.

Hoje é sábado e não quero roubar mais esta do Vinicius, mas é imperativo que eu mais me espreguice do que cuide das folhagens; que eu durma um pouco à tarde induzido pelo negrão chileno de sobrenome francês (acho que da família Sauvignon) que mal chega aqui em casa e já vai embora, do que invente qualquer coisa para fazer no parque, afinal está chovendo e faz frio. Nem meu cachorro está a fim de sair para visitar seus postes, cheirar seus pares, bater continência com a patinha traseira até o último pingo, etc. Mas, sobretudo porque é um sábado que pretendo seja diferente dos demais. Por quê? Exatamente não sei, talvez por ter ouvido noite destas uma sinopse de história que tão-somente por adivinhá-la na íntegra me engasga, me tranca o ar na garganta e ameaça embaçar o vidro dos olhos. História que finda por lembrar Schopenhauer que fala de um vazio na infinitude do tempo e espaço em oposição à finitude do indivíduo em ambos. Coisa de que só os filósofos sabem falar, mas que nós, plebeus das ciências da alma sabemos viver.  O presente é fugaz; a vida é fugaz; será que ontem existiu ou foi um sonho? E amanhã, o que será de nós se não sonharmos? Mas é sábado, um dia que não foi feito para ser fugaz, caso efetivamente queiramos nos dar contas de que estamos vivos. Se águas devam rolar que sejam as das calçadas.

Vou ouvir na íntegra essa história um dia, mas de antemão já digo que a conheço, que já li a respeito; que a vi reproduzida em tela num dos tantos filmes de amor trágico que faziam sucesso nos cinemas de antes. Lembro de um em especial dirigido pelo King Vidor realizado em 1955, tendo  chegado até nós dez anos depois. O filme tem dois atores inesquecíveis e de irresistível carisma, um clima de amor e morte passado na Guerra da Coréia e uma música que, sinceramente, a gente ouve para buscar adjetivos e lacrimeja por não saber encontrá-los. A versão no cinema tem William Holden, como Mark Elliott, um correspondente de guerra americano e Jennifer Jones, como Drª Han Suyin, uma médica asiática. Amor entregue, da época do romântico, separação brusca e prematura numa história apaixonante que recebeu no Brasil um título como se fosse letra de tango: Suplício de uma saudade. Foi um filme cuja trilha sonora oscarizada era ritmada por narizes fungando e soluços incontroláveis no escurinho do Corbacho, em tempos que se afirmava: homem não chora! Mas as gurias adoravam nos ver de olhos vermelhos. 
em tempos que se afirmava: homem não chora! Mas as gurias adoravam nos ver de olhos vermelhos.

Entretanto porque hoje é sábado e eu quero apagar os cinco dias anteriores, não vou buscar o filme na locadora nem roubá-lo da internet. Hoje não é dia para sofrer, hoje é dia de dormir a tarde e arrebentar a noite, até o último fôlego. E amar muito porque afinal há neblina densa na curva da vida e os faróis já não são os mesmos.

Certo que vou depositar um sorriso carinhoso, mesmo que um pouco amargo na memória de uma amiga dizendo-lhe em pensamento que a gente vive de morrer em alguns filmes. Porém, sempre somos chamados para estrelar outros e assim devemos estar preparados para viver com garra novos personagens.

Um comentário:

Gladis disse...

Belo texto, Jair...
E a música tema do filme, então... maravilhosa, divina.
Parabéns!
Gladis